7 de nov. de 2010

Não digam que não avisei...


O dólar vem caindo há tempos, mas a previsão é de que venha a despencar em breve.  Diversos analistas afirmam que aqueles indivíduos, firmas, governos que têm investindo em dólar irão perder se não se livrarem dessa moeda comprando mercadorias ou diversificando seus investimentos.

Todavia, a informação, ou aviso mais importante que essas análises nos dão é que, com tal desvalorização do dolar, a acontecer a qualquer momento, um choque econômico gigantesco irá abalar o mundo.

O artigo abaixo, do respeitado porfessor Wallerstein, alerta para essa possibilidade.

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"Guerra das moedas (guerra cambial)?  Of course"

Immanuel Wallerstein, Comentário 292, 1 de novembro de 2010

As moedas são um problema econômico muito particular.  Isso porque as moedas mantêm entre si um único verdadeiro relacionamento de ganhar-perder.  Isto é, qualquer que seja o mérito de revalorizar ou desvalorizar uma moeda determinada, esse mérito só ganha se outros forem vencidos.  Todas as moedas não podem desvalorizar simultaneamente.  Isso é logicamente impossível e, portanto, politicamente sem sentido.

A situação mundial é bem conhecida.  Nós vivemos em um mundo em que o dólar americano tem sido a 'moeda de reserva' do mundo.  Isso obviamente deu aos Estados Unidos um privilégio que nenhum outro país tem.  Ele pode imprimir sua moeda à vontade, sempre que acha que fazer isso resolve algum problema econômico imediato.  Nenhum país pode fazê-lo;  ou melhor nenhum outro país pode fazer isso sem penalidade, enquanto o dólar continuar a ser a moeda de reserva aceita mundialmente.

Também é sabido que o dólar tem perdido seu valor em relação a outras moedas há já algum tempo.  Apesar das flutuações contínuas, a curva tem ido para baixo por talvez trinta anos, pelo menos.

Os países do nordeste da Ásia – China, Coreia e Japão – têm executado políticas de moeda que são críticas a outros países.  Na verdade, este é objeto constante de atenção da mídia.  No entanto, para ser justo, é de nenhuma maneira fácil de estabelecer a política mais sábia neste momento, até mesmo do ponto de vista individualista de cada país. 

Eu considero o problema subjacente mais simples do que as explicações complicadas da maioria dos analistas de política.  Gostaria de começar com algumas premissas.  O status do dólar como moeda de reserva do sistema mundial é a última grande vantagem que os Estados Unidos têm no sistema mundial hoje.  Assim, é compreensível que os Estados Unidos vão fazer o que podem para manter essa vantagem.  Para fazer isso, requer-se a vontade dos outros países (incluindo nomeadamente os do nordeste da Ásia) não só para usar o dólar como um modo de calcular transferências, mas como algo em que investir seus excedentes (principalmente em títulos do Tesouro dos EEUU).

No entanto, a taxa de câmbio do dólar tem estado caindo constantemente.  Isso significa que excedentes investidos em títulos do Tesouro americano valem menos com o tempo.  A principal vantagem de tais investimentos é que sustentam a capacidade das empresas e consumidores individuais americanos para pagar as importações.  Mas, devido àquela queda da taxa de câmbio do dólar, chega um ponto em que as vantagens de tais investimentos, eventualmente, serão menores do que a perda do valor real dos investimentos em títulos do Tesouro.  As duas curvas movem em direções opostas.

O problema é tal que pode ser colocado em qualquer situação de mercado.  Se o valor de um estoque está caindo, os proprietários vão querer se livrar dele antes que se torne demasiado baixo.  Mas ao livrar-se rapidamente de um estoque,  um grande acionista pode impelir uma corrida que cause a queda de valor de outros, provocando perdas ainda maiores.  O jogo é sempre encontrar o momento elusivo para vender que não seja nem demasiado tarde nem cedo demais, ou não demasiado lentamente mas não demasiadamente rápido.  Isso requer sincronização perfeita, e a busca pela sincronização perfeita é o tipo de julgamento que frequentemente dá errado.

Eu vejo isso como a imagem básica do que está acontecendo e vai acontecer com o dólar americano.  Não é possível continuar a manter o grau de confiança no mundo que os EEUU manteve no passado.  Mais cedo ou mais tarde, a realidade econômica vai se tornar realidade.  Isto pode acontecer em um choque de cinco minutos ou em um processo muito mais lento.  Mas quando acontecer, a questão fundamental será: o que vai acontecer, agora?

Não há nenhuma outra moeda hoje preparada para substituir o dólar como moeda de reserva.  Nesse caso, quando o dólar cair, não haverá nenhuma moeda de reserva.  Estaremos em um mundo de moeda multipolar.  E um mundo de moeda multipolar é um mundo muito caótico, em que ninguém vai se sentir confortável porque as mudanças rápidas, constantes das taxas de câmbio fazem as previsões econômicas minimamente racionais a curto prazo muito precárias.

O diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional, Dominique Strauss-Kahn, está neste momento avisando publicamente que o mundo está mergulhando em uma guerra cambial cujo resultado "poderá ter um impacto de longo prazo negativo e muito prejudicial".  Uma possibilidade real é que o mundo possa reverter – parece-me que já está revertendo – para de fato trocas de mercadorias por mercadorias (escambo) – uma situação que não é realmente compatível com o funcionamento de uma economia mundial capitalista.

Caveat emptor (o risco é do comprador)!

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