27 de mai. de 2016

Mudança inesperada na postura do FMI


Um artigo realmente impressionante acaba de ser publicado no site Zero Hedge, o qual trata de uma mudança inesperada na postura do FMI, com possibilidade de implicações favoráveis aos países do Terceiro Mundo.  Leia e verifique:

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Em impressionante reversão, FMI culpa globalização de espalhar desigualdade, causando crashes no mercado


Tyler Durden, Zero Hedge, 27/05/2016 10:51 -0400


Em uma reviravolta impressionante para uma organização que repousa no alicerce "neoliberal" moderno  (um termo que o próprio FMI  [Fundo Monetário Internacional – International Monetary Fund] usa generosamente), também conhecido como sistema capitalista, durante a noite os autores do FMI Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani, e Davide Furceri publicaram uma pesquisa intitulada "Neoliberalism:  Oversold?" cujo tema é impressionante:  acusa o neoliberalismo e seu desdobramento imediato, a globalização e a ‘abertura financeira’, de causar não só a desigualdade mas, também, por fazer os mercados de capital instáveis.


A saber:


Há aspectos da agenda neoliberal que não estão dando resultados como seria esperado.  Nossa avaliação da agenda limita-se aos efeitos de duas condições:  remoção de restrições sobre a circulação de capital nas fronteiras de um país  (também chamada de liberalização da balança de capital) e consolidação fiscal, às vezes chamada de "austeridade", que é uma abreviação usada em referência a políticas para reduzir os déficits fiscais e os níveis de dívida.  Uma avaliação dessas políticas específicas  (ao invés da ampla agenda neoliberal) atinge três conclusões inquietantes:


·       Os benefícios em termos de aumento do crescimento parecem bastante difíceis de se estabelecer quando se olha para um amplo grupo de países.

·       Os custos em termos de maior desigualdade são proeminentes. Tais custos caracterizam o equilíbrio  [trade-off] entre os efeitos de crescimento e equidade de alguns aspectos da agenda neoliberal.

·       O aumento da desigualdade, por sua vez, compromete o nível e a sustentabilidade do crescimento.

Mesmo se o crescimento for o único ou principal objetivo da agenda neoliberal, os defensores da agenda ainda precisam prestar atenção para os efeitos distributivos.


Um momento...  Quer dizer que o FMI está-se tornando, gasp, marxista?  Será que a interação dramática do verão passado com a Grécia e seu breve mas memorável ex-Ministro das Finanças marxista, Yanis Varoufakis, deixou uma marca tão proeminente na subconsciência coletiva do FMI que este agora está rejeitando em demasia os princípios sobre os quais o FMI foi originalmente fundado?

 

Vamos continuar a ler para achar a resposta.


Eis aqui um parágrafo muito notável sobre a "globalização", isto é, a abertura financeira:

Além de aumentar as chances de um crash, a abertura financeira tem efeitos distributivos, aumentando sensivelmente a desigualdade.  Além disso, os efeitos da abertura sobre a desigualdade são muito mais elevados quando um crash acontece.


E o texto fica ainda melhor:


A crescente evidência da alta relação custo/benefício da liberalização da balança de capital, especialmente com relação a fluxos de curto prazo, levou o ex-Primeiro Vice Diretor do FMI, Stanley Fischer, agora o Vice Presidente do Conselho do Banco Central  (Reserva Federal) dos EUA, a exclamar, recentemente:  "a que propósito útil servem os fluxos internacionais de capital a curto prazo?"  Entre os governantes, hoje, há maior aceitação dos controles para limitar os fluxos de dívida a curto prazo que são vistos como susceptíveis de conduzir a – ou contribuir para com – uma crise financeira.  Embora não seja a única ferramenta disponível – taxa de câmbio e políticas financeiras também podem ajudar –, os controles de capital são uma viável, e às vezes a única, opção quando a fonte de uma expansão  [boom] insustentável de crédito é o empréstimo direto do exterior.


O FMI então adota em cheio a ideia da Árvore Mágica de Dinheiro  [Magic Money Tree] e reverte a um estilo observado pela primeira vez há vários anos, quando disse que a austeridade não era apenas ruim, mas a emissão de dívida pública ilimitada era provavelmente boa:


Os mercados em geral atribuem uma probabilidade muito baixa de crise da dívida aos países que têm um forte registro de ser fiscalmente responsáveis.  Tal registro lhes dá pretexto para decidir não aumentar os impostos ou cortar gastos produtivos quando o nível de endividamento é alto.  E para os países com um forte antecedente, o benefício da redução da dívida, em termos de seguro contra uma futura crise fiscal, acaba por ser incrivelmente pequeno, mesmo em níveis muito elevados de dívida/PIB. Por exemplo, mudar de um relação da dívida de 120% do PIB para 100% do PIB ao longo de alguns anos contribui muito pouco em termos de reduzir os risco de uma crise no país.


Mas, mesmo que o benefício do seguro seja pequeno, pode ainda valer a pena a incorrer se o custo é suficientemente baixo.  Acontece, porém, que o custo poderia ser grande, muito maior do que o benefício.  A razão é que, para chegar a um nível inferior de dívida, impostos que distorcem o comportamento econômico precisam ser aumentados temporariamente ou despesas produtivas precisam ser cortadas – ou ambos.  Os custos dos aumentos de impostos ou dos cortes de despesas necessárias para derrubar a dívida podem ser muito maiores do que o risco de redução da crise decorrente da dívida inferior.  Isto não significa negar que a dívida alta é ruim para o crescimento e o bem-estar.  Ela é. Mas o ponto chave é que o custo maior da dívida alta  (os chamados encargos da dívida) é tal que já terá sido incorrido e não pode ser recuperado;  é um custo perdido.  Perante uma escolha entre viver com uma dívida maior – permitindo que a relação da dívida decline organicamente através do crescimento – ou deliberadamente executando excedentes orçamentais para reduzir a dívida, os governos com amplo espaço fiscal farão melhor ao viver com a dívida.


Claro, o que tanto o FMI e os lunáticos da Árvore Mágica de Dinheiro não compreendem é que a única razão pela qual os juros da dívida não explodiram em um mundo que nunca teve mais dívida  (um processo que inevitavelmente termina em guerra) é graças à monetarização da dívida pelo banco central, e à atuação dos investidores frente aos bancos centrais.  Vamos voltar aos ‘custos baixos da dívida’ se e quando a inflação obrigar os bancos centrais a inverter o que tem sido um processo de mais de 30 anos que começou com a grande moderação e terminará ou com ‘dinheiro de helicóptero’  (e, portanto, a hiperinflação) ou com os bancos centrais sendo donos de todos os ativos  (e, portanto, a morte do capitalismo).


Mas, voltando ao discurso retórico do FMI, no caso de a dramática inversão da marcha do FMI em seu apoio a uma agenda neoliberal não estava clara, aqui está outra reiteração:


Em suma, os benefícios de algumas condições que são uma parte importante da agenda neoliberal parecem ter sido um pouco exageradas.  No caso da abertura financeira, alguns fluxos de capital, tais como o investimento estrangeiro direto, parecem conferir os benefícios reivindicados para eles.  Mas, para os outros, particularmente os fluxos de capital a curto prazo, os benefícios para o crescimento são difíceis de colher, enquanto que os riscos, em termos de maior volatilidade e risco aumentado de crise, avultam.  No caso de consolidação fiscal, os custos de curto prazo em termos de produção e bem-estar inferior e aumento do desemprego têm sido subestimados e a conveniência para países com amplo espaço fiscal de simplesmente viver com dívida elevada e permitindo que as relações da dívida declinem organicamente através do crescimento é subvalorizada.


Frase de efeito do FMI:


[D]esde que ambos abertura e austeridade estão associados com o aumento da desigualdade de renda, este efeito distribucional configura um ciclo de feedback negativo.  O aumento da desigualdade engendrada pela abertura financeira e pela austeridade pode em si minar o crescimento, a única coisa que a agenda neoliberal tem a intenção de impulsionar.  Agora, há fortes evidências de que a desigualdade pode diminuir significativamente o nível e a durabilidade do crescimento.


E aqui está o FMI a fazer o impensável e acenando para Marx:


A evidência dos danos econômicos da desigualdade sugerem que os responsáveis políticos devem ser mais abertos à redistribuição do que são.


Como um lembrete, isto está acontecendo poucos dias depois do Banco Central  [Fed] de St. Louis admitir que o Banco Central  [Federal Reserve] em si é, indiretamente, o motivo principal da atual desigualdade de riqueza recorde com seu foco sobre o "efeito riqueza" e aumentando os preços dos ativos.




* * * 


Qual é a conclusão de tudo isto?  Talvez que a promoção da redistribuição da riqueza global e o fim do capitalismo convencional estejam em andamento.


Como esta transição ocorrerá é desconhecido:  seja por decreto governamental, por mudança de regime, por um governo – paradoxalmente – global  (um em que o FMI teria todo o prazer em administrar a política monetária global) para controlar a globalização, ou mais simples de todos, por ‘dinheiro de helicóptero’, ainda não está claro.


Seja lá como for, alguma coisa está pra acontecer;  porque, para um texto impressionante como esse ser publicado, certamente teve que ser avaliado não só por todos os níveis executivos do FMI, mas certamente pré-aprovado por todas as instituições financeiras instituídas.


E isso deveria causar uma grande apreensão...


Aqui está o papel original do FMI, em inglês:  'Neoliberalism:  Oversold?'  (IMF)

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