28 de mai. de 2014

Planejando pelas costas dos povos do mundo

O texto abaixo, escrito há 14 anos, mostra que o Partido Comunista Portugues estava bem-informado à época sobre as futuras intervenções imperialistas nos países soberanos. Verifique:

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Não abusem

Carlos Aboim Inglez,
Avante!, Nº 1371, 9 de março de 2000

Após o chamado ‘fim da guerra fria’, na Fundação Carnegie, um dos covis onde os lobos tramam os planos de ataque dos EUA, uma seleta elite (Abramowitz, Albright, Scheffer e outros) trabalhou afanosamente na elaboração de uma nova estratégia, mais ativa, que substituísse a anterior e assegurasse a salvação da OTAN como instrumento indispensável de preponderância na Europa. O seu relatório de 1992, ‘Mudar os Nossos Hábitos: o papel da América no Mundo Novo’, preconizava, em conclusão, adotar um ‘novo princípio das relações internacionais:  a destruição ou a deslocação de grupos de população no interior dos Estados podem justificar intervenção internacional’. E, para tal, os EUA deveriam ‘realinhar’a OTAN e a OSCE (Organização para Segurança e Cooperação na Europa). No mesmo ano, David Scheffer é co-autor de outro estudo da mesma Fundação, ‘A Autodeterminação na Nova Ordem Mundial’, onde traça o cenário de futuras ações: ‘Quando uma reivindicação de autodeterminação desencadeia um conflito armado que se torna uma crise humanitária’, a intervenção externa é um imperativo indiscutível’ pelo que há que ‘redefinir o princípio de não ingerência nos assuntos internos dos Estados’. E, para tal, ‘os EUA devem procurar um consenso à volta da sua posição no seio das organizações regionais e internacionais , mas não devem sacrificar os seus próprios juízos e princípios se um tal consenso faltar’. O conhecido desabafo de Madeleine Albright – ‘Para que serve ter a maior força militar do mundo se não a utilizarmos ?!’- ganha assim estatuto de brutal diretiva para a política externa do imperialismo americano. Os povos dos Balcãs ( e não só...) que o digam.

Muitos outros ‘especialistas’trabalham nesta matéria. Zbigniew Brzezinski, no seu livro ‘O Grande Tabuleiro de Xadrez’, de 1997, fornece fundamentações geoestratégicas para o imperialismo dos EUA, tendo como alvo central aquilo a que ele chama ‘os Balcãs Euroasiáticos’, indo das margens do Mar Negro às fronteiras da China, com Cáucaso e Cáspio no coração. Na conferência de imprensa em Paris para a apresentação da obra , em 1998, um jornalista pediu-lhe para explicar o ‘paradoxo’ de a sua doutrina por ser tão ‘pragmática e impregnada de realpolitik’ enquanto ele teria sido um destacado ‘defensor dos Direitos do Homem’. Descarado, Brzezinski esclareceu : ‘Elaborei essa doutrina(...) porque era a melhor maneira de desestabilizar a URSS. E funcionou. ‘ Descarado, deu um exemplo de como não se limitava a belas palavras sobre os Direitos do Homem mas sabia também fazer o trabalho sujo. Contou como a CIA começou a fornecer armas aos contrarevolucionários afegãos em meados de 1979, seis meses antes que a URSS acedesse aos pedidos de ajuda do Governo do Afeganistão. E rematou : ‘Nós não obrigamos os russos a intervir, mas conscientemente tornamos essa intervenção mais provável . Esta operação clandestina foi uma excelente idéia. Teve como efeito atrair os russos para a armadilha afegã.’ Quantas outras armadilhas se estão tecendo ?!

Estes casos ficam em geral no segredo dos deuses : trata-se de ‘alta política’, não para consumo dos simples mortais. Por isso, a barragem de condicionamento ideológico sobre o ‘direito à autodeterminação’, o ‘ direito de ingerência humanitária’, os ‘direitos do Homem’, se torna uma litania interminável, adequadamente teorizada e ilustrada mediaticamente por imagens de horror . Tal lavagem ao cérebro serve às mil maravilhas os velhos/novos apetites do grande capital e da força político-militar imperialista que o serve. É imprescindível denunciar os seus mentores originais: para que não abusem da nossa razão e do nosso coração. As vítimas são os povos. E os povos zangam-se.

NOTA:  Revisado para o portugues do Brasil.

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